quinta-feira, 17 de março de 2011

TENTANDO ESPANAR O ESPANADOR DO MOVIMENTO NEO-NEO-CALVINISMO

Caro Helder Nozima,

Seu artigo, em http://5calvinistas.blogspot.com/2011/03/novos-reformados-servos-da-nossa.html#comment-form, é repleto de dados precisos, remissões a pessoas diferentes e a idéias interessantes. Tem pontos edificantes. Diria até, sem fazer favor nenhum, é, em grande medida, edificante. Apreciei-o. Mas há nele algumas coisas que me sugere, se me permite, alguns apontamentos.

1. É perigoso você fazer corte. Inevitável alguém se sentir alcançado por uma linha imaginária a dividir meio que antipaticamente “novos” de “velhos”. Qualquer pessoa pode se sentir atingida. Atingido é o termo, e não ofendido, por que sei que você não foi movido com essa intenção. Sei que você reage às atitudes inamistosas por parte de quem não concorda com você. Por vezes me sinto e sou tentando agir assim com algo que pode parecer retaliação. Mas fazer o que e como? Virar uma metralhadora giratória? Fato é que chamar-se, a um grupo de que faz parte ou de um projeto de reduto, de “novo” é indicar que existam “velhos”. Algo que imediatamente percebo que conspira até contra o seu objetivo expresso, combater as divisões existentes em nossos meios. Mesmo assim você se distingue como novo e destaca os “velhos”?

2. Provavelmente certo que você desejou, com êxito, reagir e cindir (cortar e costurar) pretextos, intenções, resoluções, atitudes equivocadas, desconexas, atabalhoadas. Nada contra, apenas pondero, que resolvido fazer assim, intencionalmente, há que se ter consciência que isso exige medida certa de ousadia, inevitável; e de cuidado, indispensável, o que é algo que nem sempre acertamos na dose. Qual deve ser a dose certa de ousadia e cuidado para que a reação não vire reacionarismo e a cisão não nos leve às posturas cismáticas?

3. Você acerta em cheio quando lembra em texto áureo do Rei Davi, tipo de Cristo, paradigma de cristão, tomado desde sempre pela Igreja. Poderíamos lembrar também de Noé, Daniel, Neemias... e da Rainha Ester (porque não?) que marcaram as suas respectivas gerações “Porque, se de todo te calares agora, de outra parte se levantará para os judeus socorro e livramento, mas tu e a casa de teu pai perecereis; e quem sabe se para conjuntura como esta é que foste elevada a rainha?” Ester 4:14. A situação está feia, mas há socorro e livramento para a nossa causa comum da Reforma, que outra causa não é senão a Evangélica, a Protestante, a verdadeiramente Católica, a causa de Cristo. Nem por isso devemos nos calar. Mas ao falar, a gente deve tomar cuidado para não arruinar de vez. A posição de rainha exige essa responsabilidade por que com nossa boca a gente se posiciona a favor ou contra o socorro e o livramento que vem do Senhor. Mas, voltemos ao Rei. A nossa platéia não gosta muito de que falemos de rainhas, profetizas, pastoras... Devolvamos o papel paradigmático a um de nossa classe, dos varões, valorosos, viris, a quem cabe privativamente subir ao púlpito para apregoar todos os desígnios de Deus. Tal como “serviu à sua própria geração, conforme o desígnio de Deus”, devemos também servir-Lo. E é isso o que você sugere. É isso, veja que coisa, que tem sido o desafio e a frustração desde “líder” cristão familiar e eclesiástico, fracassado, velho de guerra, que se sente a própria bananeira que já deu cacho, um só, aliás, e este de não tão boa qualidade... Misericórdia? Nisso que se nos dá, para nossa “radiolinha”, termos certos sentimentos aguçados. A gente sente-se, por vezes “listado”, de uma maneira ou de outra, como “velho”, defensor de idéias e clichês velhos, bolorentos, e por que antigos e ultrapassados, por vezes até caricaturados....

4. A obra da Reforma foi um grande sucesso. O Reformador Calvino foi exemplo extra-bíblico, um dentre muitos, de quem marcou indelevelmente sua geração. Seu legado chega até hoje de tal maneira que todo e qualquer movimento, sistema, denominação, comunidade que não esteja enraizado no catolicismo romano, portanto, não-reformado, em no luteranismo ou não seja estritamente anabatista, tem suas raízes históricas, teológica, doutrinária e sociológica no calvinismo. A primeiras propostas de neo-calvinismo foram propostas ainda em Genebra por Serveto, Castejon e outros e tiveram que ser combatidas pelo próprio devido algumas, digamos, corruptelas, para ficar barato. A mais intensa foi a proposta de neo-calvinismo de Arminio e depois tivemos de Moise Amirault... Todas posteriormente classificadas como “infiéis”. A mais fiel talves seja a proposta do Rev Abraham Kuipper, a qual nos referiremos posteriormente, que, infelizmente, você fez questão de descolar o seu movimento deste. Uma pena. Ah, como lamento! Mas, é fato alvissareiro o êxito triunfal tanto do calvinismo quanto dos neo-calvinismo, esse pagando justo tributo àquele. Mas, no entanto, a teologia reformada, clássica, pura, que retorna às fontes, como sistema geral, orgânico, capaz de conferir alguma identidade própria, duradoura (isso parece você me lança ao rosto, no que devo concordar – fazer o que?), fracassou flagrantemente. Razão por que precisa para sobreviver, com mínimo de vitalidade, ser mesclada com um pouco de pentecostalismo, em certo sentido neo-calvinismo que ficou velho, que foi remasterizado por novel-neo-calvinismo chamado de neo-pentecostalismo, razão por que não faz mal nenhum para ninguém, o que, aliás, não deixa de ser uma coloração diferente do ser reformado! Uma coloração mais forte e mais correta, na medida em que enfatiza “carismas”, solução indispensável para que o calvinismo se revista de nova roupagem. Então, o neo-calvinismo é mais pentecostal, menos traditional, mais contemporary; menos não-pentecostal ou menos anti-pentecostal do que o vetusto calvinismo. Será mesmo isso que você quis eu extraísse? Se for, trata-se de uma boa tese. Assina em baixo? É isso? Se você assina em baixo, fazer o que? Sigo o voto do relator... Jogo a toalha.

5. Observo que você transita da nomenclatura “novo calvinismo” para o “novo ser-reformado” para o seu movimento. Na minha mal disfarçada, desmascarada e vil arrogância de visão canhestra, exclusivista ou reacionária, “novo reformado” não existia. Estava enganado quando achava que seria uma redundância elíptica e recorrente, com a escusa da repetição? Equivale dizer, teologicamente, seria o cúmulo do pleonasmo. Se for reformado, um dia cheguei a pensar assim, não tem essa de velho ou novo. Reformatum est per se reformanda semper est! É reformado. É original. É novo sempre! Não precisa de renovação nunca! Era o que eu pensava. Sinto abaladas as minhas convicções. Procede?

6. É triste ter que reconhecer que ficamos “velhos reformados”. Deve ser mais triste para alguém ter nos recordar disso. Triste missão. Acho que deve doer mais nesse alguém que assim alveja os irmãos. Puxa, de repente, me sinto com pena mais de alguém do que mim mesmo, apesar de que a minha situação é essa no buraco e esse alguém está fora dele e me estende a mão forte para tirar-me dali. De repente, esse sofrer solidário desse alguém que se importa com a minha situação miserável de esclerosado, me comove. Devo fazer todo esforço para não somente sair desse buraco, mas para não permitir que o meu peso possa puxar para dentro do buraco aquele que me salvar. E olha que não digo com ironia. Pode crer. Isso é o que venho sentindo, acho que pode até ser reflexo da andropausa. Mas, é verdade, paramos no tempo mesmo. Congelamo-nos numa situação abaixo da critica. Somos como aqueles prédios embargados pela Prefeitura (ou pelo GDF, se você preferir) enquanto ainda não passávamos de estrutura de concreto armado. Abandonados pelos construtores, expostos à chuva e ao vento, mostramos sinais evidentes de degeneração, corrupção, caquexia. Não servimos mesmo para nada senão enfear a cidade, comprometer o paisagismo. Servindo-nos de reduto de vagabundos sem-teto urinadores e defecantes, lar-doce-lar de moscas, ratos e baratas, a nada se nos destinam senão para sermos implodidos e reduzidos a escombros para que sobre estes se erga o novo. Fracassamos. É duro ter que ouvir o julgamento de que preferível fosse ter-nos aberto a tornarmos os pleonasmos ambulantes, neo-reformados, à conformação com sermos mais do que paradoxos, umas irônicas e aberrantes antíteses do “movimento parado” de Reforma que de reforma não tem nada, senão umas belas fórmulas vazias, vazadas em linguagem anacrônica, velhos caquéticos, arruinados,... reformadamente falando. Uma estrutura carcomida que serve apenas para indicar que ali alicerces profundos, pilares bem edificados, uma imagem que só faz gerar aborrecimento e engendrar o comentário: “é teremos que usar uma porção maior de dinamite para reduzir a pó esse troço”. Por mais triste que seja o meu retrato devo beijar a mão do retratista, sabedor de que ele também vai me estender a mão e me ajudar a sair desse buraco.

7. Você adentra outro campo perigoso. Entende que devemos enfrentar os “anacronismos da tradição”. Fazer a tradição submetida à Palavra. Escorar a estrutura com tijolos belos e bem recortados, apoiando-os com grossa argamassa, encobrindo suas fissuras com reboco de cimento, e adorná-la de lindos vitrais... enfim dar por concluído o lindo projeto. Nisso concordamos. Nas entrelinhas, porém, vejo que você quer introduzir ou justificar inovações litúrgicas que chocam as liturgias tradicionais. Inovações litúrgicas podem ajudar na expressão da alegria que caracteriza um viver cheio do Espirito. Não adianta você tentar negar, todo carismático acaba se contentando apenas com o ser característico apenas inovador litúrgico. Isso se dá por que não poderá afirmar e reafirmar que o falar em línguas e/ou o exercitar de outros dons de sinais indica de fato a plenitude do Espirito. A pessoa cheia do Espirito é a que lá fora testemunha no poder que o revestimento do Espirito dá e vive a missão integralmente e... aqui dentro, na igreja, louva, adora, no Espirito, com a liberdade que o Espirito dá... Entram as danças litúrgicas e até introdução do hip-hop nos cultos? Por que, afinal excluir determinada expressão cultural do culto? Por que considerar mundanos certos ritmos? Nem certos ritmos, tampouco certas expressões. O velho e o novo são bem caracterizados nas expressões “traditional” e “contemporary”. Se isso é algum material básico ou de acabamento a ser aproveitado, eia, vamos aproveitar... Mas como vejo que isso é pedra, tem ainda muito a que lapidar.

8. Arranho o perigo de você rotular novo e velho; “traditional” e “contemporary”. E aqui você se prepara por que vêm palavras fortes. Ronca a tapera velha. Quando a gente adentra o campo, o contexto do culto divino, para questionar o que pode ser mais santo e agradável a Deus, ou por que determinada expressão externa ofertada não foi, ou não pôde ser aceita, há risco grande de termos vitima ao chão com sangue derramado; agressor do lado; e o quadro se completa com a oferta sangrenta caída defronte do altar. O conflito de irmãos gêmeos que desejam a mesma coisa de formas diferentes, trazendo que em essência podem ser muito diferentes. Os gêmeos devem vistos sem serem listados. Quando se lista o novo, contrapõe o velho, como é que você acha que este se sente? Lista o “bem”, contrapõe o “mal”... O “contrapostado” ferido fica com o semblante descaído. Você lista o “belo”, e o “feio”? Gêmeos se agridem, se deixam agredir ou um deles de inopino é agredido. Eu tenho aprendido, a propósito, nesses meus dias pós-mortem, que não devo listar... Adjetivar.... Devo tentar ser reformado, crente, evangélico, adorando a Deus, em espírito e verdade, mesmo que não consiga, por mera culpa e responsabilidade minha. Listar alguém em que isso pode me ajudar? ...E você me ajuda? De alguma maneira penso que você quer me ajudar...

9. Nova Dolentia. O que ajuda a trazida da idéia de “novo calvinismo”, como um novo caminho, nova luz, nova sacada? Uma obra continuadora do que ficou abandonado no passado (continuing)? É até plausível, o ser novo calvinista, no sentido de ser calvinista de novo. Como no passado, seremos de novo. Era a proposta do Rev Abraham Kuipper na chamada Dolentia de 1886. No contexto tínhamos uma igreja reformada, herdeira do calvinismo que tinha deixado de ser preponderantemente calvinista na melhor acepção dos termos. Havia uma ortodoxia calvinista que não se fazia cediça a uma ortopraxia, havia o pietismo de calvinismo mitigado com elementos remonstrantes e até pré-carismáticos (revivalistas) e um liberalismo teológico que se dizia o calvinismo progressivo, do tipo “reformata semper reformanda”, corrente majoritária. Havia um clero profissional, a expressão exata da maria-vai-com-as-outras. As pessoas na igreja tinham esquecido as confissões de fé e não se atinavam para o seu valor em termos de trazer mais vida à igreja e ao seu testemunho no mundo. Essa era a idéia de tentar ser calvinista de novo, num mundo novo, enfrentando novos desafios de um novo século que se avizinha. Mas o que é seu neo-calvinismo? Seria uma nova maneira de resgatar, atualizar e cultivar o pensamento do Reformador João Calvino, a começar pelas doutrinas da graça? Uma nova maneira de renovar o interesse por Calvino nos dias de hoje? Esse movimento neo-calvinismo permanece nos dias de hoje. O seu tenta combinar o calvinismo com o neo-pentecostalismo e outras contribuições modernas da Igreja e para a Igreja. Isso é indiscutivelmente meritório e condição indispensável para trazer a Reforma em sua integralidade para os dias de hoje? Isso ajuda? Essa nova coisa, até o novo calvinismo de Kuipper, não é nova reforma, e quando mesclada de pentecostalismo, liberalismo e outros ismos... Redunda não num, mas em diversos neos-calvinismos. Diria, no entanto, que não há, acho, achava, sei lá, já não estou discordando de nada, como dizer “neo-reformado”. Nova dolentia não, né?

10. O que traz de realmente novo esses “neo-calvinistas” de que você tem falado? Está embasado nas idéias de Mark Driscoll, que segundo soube trata-se de um novão, digamos, tiozinho sukita, de uns quarenta e poucos anos, calvinista de 4 pontos (amyraldiano), adepto da predestinação simples. Adepto da igreja emergente. Um calvinista de bermudas. Esse negócio de Bermudas me pressagia muito mal. Por algumas motivos, acho que talvez você tenha chamado equivocadamente chamado esses “driscollianos” de “neo-reformados”. Estão certo em muitas coisas. Pela minhas contas, tendo eles deduzidos 20% dos pontos calvinistas, probabilisticamente talvez estejam 80% certo. Um alto índice. Mas quanto ao fator novidade? Colocar a Escritura acima da Tradição é realmente novo? Significa ter que necessariamente ser premido a desprezar da Tradição? Você já diz que não...

11. É novidade “reconhecer que a cultura e a sociedade do século XXI trazem os seus próprios desafios e acreditar que a Bíblia tem uma resposta para o nosso tempo”? Sim, a Bíblia tem respostas. A ciência tem respostas. Por que tenho que chocar as respostas da Ciência com pseudas-respostas “cientificas” da Bíblia?

12. Ser calvinista de teologia reformada sem ser calvinista de sistema de governo próprio e de visões próprias acerca de expiação, batismo, escatologia, dons etc, é algo novo, ou é algo que sempre fizeram por ai os indepedents?

Continuo...

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