sexta-feira, 3 de julho de 2009

NOSSA IDENTIDADE - O QUE É SER REFORMADO? - PARTE 3




O que cremos:

A ênfase doutrinarista

1. Escritura (2 Timóteo 3:16)

Os reformados têm uma alta visão acerca da Escritura. Crêem que a Bíblia é a palavra de Deus inspirada, infalível e autoritativa. Duas passagens da Escritura iluminam a natureza e a autoridade da Escritura:

Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.. (2 Tim. 3:16-17)

Sabendo, primeiramente, isto; que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação, porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo (II Pedro 1:20 - 21)

Inspirada, infalível e autoritativa são três palavras que os reformados freqüentemente utilizam para explicar sua visão da Escritura. Inspirada tem em vista a fonte da Escritura: Deus mesmo que fala por seu Espírito Santo através dos autores humanos. Infalível significa que a Escritura é verdadeira e absolutamente sem falhas em matéria de fé e prática. A Bíblia é verdadeira e fidedigna em tudo o que pretende ensinar. Autoritativa se refere à reivindicação da Palavra de Deus para que os crentes vivam a vida de verdadeiros servos debaixo do domínio de Deus, e por isso chamados para obedecer a Palavra de Deus.

Durante a Reforma, os reformados afirmaram Sola Scriptura (Somente a Escritura) para distinguir-se da Igreja Católica Romana, que afirmavam que a Escritura, a tradição (os ensinos da igreja), e os pronunciamentos oficiais da igreja estavam tudo no mesmo nível de igualdade em termos de autoridade. A isso os reformadores responderam que somente a Escritura é nossa autoridade para a fé e a vida.

Hoje a ameaça mais forte a essa visão elevada da Escritura não é dos que querem elevar os ensinos da Igreja a um nível de autoridade igual a da Escritura. Mas, é dos que querem rebaixar a Escritura, dizendo que não é Palavra de Deus em tudo, não é de Deus o que não for historicamente exato, e coisas como a ressurreição são mitos piedosos, e que não é de fato autoritativa para nossas vidas. Os cristãos reformados resistem firme a tudo o que ao olhar moderno e a mente iluminista possam considerar tolice, crêem que este livro é o meio pelo qual Deus do universo se comunicou com os seres humanos, os portadores de sua imagem. Acreditam que este livro é a Palavra de Deus.

Outra ameaça à elava visão da Escritura nos dias de hoje é o que pode ser chamado de visão da revelação de Deus como ainda não acabada. Muitos cristãos testificam Deus se lhes auto-revelam pessoalmente, interna, e excepcionalmente. Enquanto os reformados jungem inteiramente a obra do Espírito Santo com a Palavra, insistindo portanto que o Espírito e a Palavra trabalham juntos. Conforme Henry Stob, antigo professor do Seminário Calvino nos EUA, indicou sucintamente, “o Espírito sempre cavalga na garupa da Escritura”. Ou como o celebre Bernardo de Clairvaux disse, “A Escritura é a adega do vinho do Espírito Santo”.

Finalmente, uma palavra sobre a mensagem da Bíblia. É possível aos cristãos ficarem tão absorvidos em debates acerca da natureza e autoridade do Bíblia que perdem a sua mensagem positiva. A Bíblia não é antes de tudo um jogo de problemas a resolver; é uma história dramática de salvação do mundo por Deus. O ator principal nessa história é Jesus Cristo. O clímax dessa história é sua morte e ressurreição. Tudo isso e mais é o que a igreja tem em mente quando diz que é a essência da Bíblia é a “revelação redentiva”.

2. Criação, queda e redenção (Colossenses 1:15-20)

Criação/queda/redenção é uma forma basicamente reformada de organizar e de compreender a Bíblia e sua mensagem, e de compreender a história. Deus criou o mundo; o mundo caiu em pecado; Deus redimiu e redime o mundo através da obra de Cristo, uma redenção que um dia estará completa quando Deus criar novos céus e nova terra.

Os pastores e presbíteros sempre se deleitam quando os mais jovens se apresentam para fazer profissão da fé. No curso da entrevista, ao jovem é geralmente se pergunta, “o que significa ser cristão?” Os pastores e as presbíteros ficam satisfeitos com toda a resposta que inclui uma clara referência a Jesus Cristo, o Filho de Deus, e à sua morte e ressurreição para nossa vida eterna. Os pastores e presbíteros reformados ficam duplamente satisfeitos quando um jovem começa assim a resposta a essa pergunta,

“Bem, os cristãos crêem que no principio, Deus criou todas as coisas E então, o mundo caiu em pecado...”. Criação/queda/redenção é a maneira de povo reformado contar a história. É o roteiro da história e da Escritura. Mais serão acrescentados mais tarde sobre a importância da doutrina da criação. Aqui, entretanto, a importância crítica do ensino bíblico de que os seres humanos são portadores da imagem de Deus deve ser anotada.

Disse também Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança: domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todo o réptil que se arrasta sobre a terra. Criou, pois, Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. (Gen. 1:26-27). O ensino bíblico de que os seres humanos são portadores da imagem de Deus é central para o autoconhecimento e o conhecimento de Deus. É por causa da imagem de Deus dos seres humanos é que eles cumprem o mandato divinamente concedido de dominar sobre todas as coisas (V. 26) e vivem em comunhão uns com os outros.

Conforme diz João Calvino no inicio das suas Institutas, os seres humanos começam saber mais sobre si à medida que aprendem mais sobre Deus, e saber mais sobre Deus quando aprendem mais sobre si mesmos. Isso é assim porque os seres humanos, de fato, são portadores da imagem de Deus.

A verdade que os seres humanos são todos portadores da imagem de Deus tem implicações para qualquer posição ética que a igreja assume, inclusive, no que tange ao aborto, sexualidade, casamento, abuso, pena de morte, guerra, raça e deficiência física. Poucas doutrinas bíblicas deixaram marcas tão expressivas no discurso ético da igreja do que a doutrina da criação da humanidade à imagem de Deus. Certamente, nós somos “assombrosamente maravilhosos” (Salmo 139:14).

3. Graça (Efésios 2:8-10)

Graça é favor imerecido de Deus. Graça é amor incondicional e livremente dado por Deus às pessoas que não podem fazer nada para ganhar mas pode somente aceitá-la como um presente. Graça é o amor do pai da parábola do filho prodigo que o moveu a dar boas vindas e aceitar o filho perdido, não pelo que fizera ou não, mas simplesmente porque o pai amou a seu filho incondicionalmente. Graça é a assombrosa verdade de que nada há que façamos que induza a que Deus nos ame por isso mais ou menos. Deus nos ama porque nos ama. Deus nos ama porque é rico em amor.

Historicamente, quando os reformados discorriam sobre a graça enfatizavam que a salvação é um dom de Deus, não uma realização humana. Certamente, como Paulo diz,

Pois pela graça é que sois salvos mediante a fé; e isto não vem de vós, é o dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus antes preparou para que andássemos nelas.
(Efésios 2:8-10)

Os “cinco pontos do calvinismo” concernem às doutrinas reformadas que underscore a natureza radical da graça de Deus. Tem sido freqüentemente sumarizados pelo acróstico o TULIP (Depravação Total, Eleição (U) Incondicional, Expiação Limitada, Graça Irresistível e Perseverança dos Santos). Este acróstico, TULIP, tem sido por vezes mal interpretado como se focalizassem as falhas humanas. Mas, do fato, sua ênfase central é o graciosidade de Deus, e os ensinos bíblicos que se encontram por trás dela são alguns dentre os ensinos mais ricos de toda Escritura:

- Todo o ser humano e cada parte da sua existência humana estão corrompidos pelo pecado, a humanidade está sem auxilio e sem esperança a menos que seja operante a graça de Deus. Paulo diz, “estando vós mortes em seus pecados e delitos” (Efésios 2:1). Em sua condição decaída, os seres humanos não estão apenas enfraquecidos, doentes ou em desvantagem. Estão mortos, incapazes de fazer qualquer coisa, incapazes de crer, e sem auxilio de Deus.

- Em sua divina misericórdia, Deus escolheu os crentes e os chamou-os para si em amor antes mesmo deles nascerem, certamente, antes mesmo da criação do mundo. “[Deus] nos escolheu nele[Cristo] antes da fundação do mundo para sermos santos e irrepreensíveis perante ele, e em amor nos predestinou para a adoção de filhos por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito da sua vontade”. (Efésios 1:4-5). Deus não elegeu seus filhos baseadas em seu pré-conhecimento de quem creria mas tão-somente “segundo o beneplácito de sua vontade”.

– A graça salvadora de Deus não é universal, mas particular, dada somente a quem Deus escolheu desde a eternidade.

Porque os que dantes conheceu, também predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele fosse o primogênito entre muitos irmãos; e aos que predestinou, a estes também chamou; e aos que chamou, a estes também justificou; e aos que justificou, a estes também glorificou. (Rom. 8:29-30)

- A graça de Deus, não é a decisão humana o fator decisivo na salvação. Os crentes não escolhem a Deus tanto quanto Deus escolhe os crentes. Jesus ensinou que “quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus” (João 3:5) e “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer” (João 6:44). Certamente, a fé é ato e decisão humanos. Mas mesmo esta fé é um dom de Deus.

- Pelo seu poder, Deus sustenta os crentes firmemente em sua mão e não permitirá que qualquer um ou qualquer coisa possa separar dele mesmo. Jesus diz,

“As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão”. (João 10:27-28)

Os crentes são sustentados firmemente pela mão por Deus. Os crentes não estão pendurados em Deus tanto quanto Deus de fato agarra os crentes. Isso foi chamado a segurança eterna do crente; perseverança dos santos. Conforme Paulo diz no fim de Romanos 8,

Quem nos separará do amor de Cristo? ... Porque eu estou bem certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor. (vv. 35-39)

Quando os calvinistas falam sobre de salvação, não encontram palavras para expressar o quanto ela é completamente uma obra de Deus – do começo ao fim, dom de Deus e graça de Deus, o que se expressa pelos termos do hino,
“em nada ponha minha fé
senão na graça de Jesus,
no sacrifício remidor
no sangue do bom redentor!”

4. Aliança (Jeremias 31:31-34)

Aliança é um dos mais ricos conceitos bíblicos usados descrever o relacionamento de Deus com seu povo. Aliança significa parceria, acordo entre partes, o que envolve promessas e obrigações.

É significativo que a Bíblia, particularmente o Antigo Testamento, retrate repetidas vezes Deus como quem se liga a si próprio com o seu povo por meio de promessa, de obrigação, de aliança. Deus não tem que prometer nada. Mas repetidas vezes o faz, a Noé, a Abrão, a Moisés, e a Davi, prometendo amá-los e estar com eles.

A Bíblia inteira é sustentada pelas grandes alianças que Deus fez com todas essas e outras pessoas. Além disso, a Bíblia é unificada em torno da aliança da graça. Uma das razões pela qual se tende a ouvir mais pregação sobre o Antigo Testamento nas igrejas reformadas do que em muitas outras igrejas é que os pregadores reformados não colocam o Antigo Testamento contra o Novo Testamento. Ao invés disso, vêem ambos os testamentos, o Antigo e o Novo, revelando apenas uma aliança da graça - que começa com a promessa de Deus a Adão e a Eva de que esmagaria a cabeça da serpente e termina na nova cidade de Deus descrita em Apocalipse 22.

O conceito de aliança – o próprio Deus ligando-se com seu provo com base em promessa e compromisso – é um rico conceito para a compreensão da obra salvadora de Deus nos dias de hoje. No louvor, Deus nos renova as suas promessas de aliança, e nós renovamos nossos votos de aliança a Deus. Na pregação declara-se e oferece as promessas da aliança de Deus. A Ceia do Senhor é um sinal da nova aliança de Deus. No batismo, Deus promete ser fiel a nossos filhos. Os membros da igreja fazem promessas a Deus e a uns aos outros.

Juntas essas promessas dão forma a uma corrente de compromissos, de mútua conexão a qual conhecemos como Corpo de Cristo, que é a Igreja. A membresia na Igreja é muito importante porque quando alguém se junta à ela, não é somente um nome que está sendo incluído no rol de membros de uma organização, mas há uma participação na aliança com Deus e com os outros crentes. De acordo cm esta compreensão aliancista da Igreja, deixar uma congregação por uma outra é uma questão muito séria porque quebra os elos de uma rica corrente de conexões aliançais e dos compromissos feitos em nível de igreja local.

A aliança é uma ênfase importante e estratégica para a igreja nessa cultura individualista que se presencia. Numa época em que a sociedade está tentando desesperadamente se postar frente a moralidade e os caracteres em voga, os cristãos compreendem o papel chave do cumprimento de promessas.

Nossa sociedade necessita de comunidades de promessas. A Igreja precisa de ênfase hoje sobre a aliança em nossa compreensão de Deus e da igreja.

5. Graça Comum (Mateus 5:43-48)

A graça comum de Deus, em distinção da graça salvadora, refere-se à atitude do favor divino que se estende à humanidade em geral; igualmente a crentes e descrentes. A igreja tem observado três evidências distintas da graça comum no mundo. Primeiramente, Deus dá dons naturais aos descrentes tanto quanto aos crentes. Não tem que ser cristão para ser um excelente pianista, advogado ou cientista. Em segundo lugar, Deus retém o pecado em todas as pessoas. Por causa do pecado, os seres humanos não são tão bons como poderiam ser; mas por causa da graça comum, não são tão maus como quaisquer um poderiam ser.

Essa é razão por que alguns descrentes parecem realmente se comportar melhor do que os crentes. as virtudes tais como paciência, coragem e a compaixão nunca perdem totalmente sua ressonância em todo portador da imagem de Deus.

Em terceiro lugar, Deus habilita ais descrentes a realizarem atos positivos de boa civilidade. Deus preserva o sentido básico da justiça cívica que permite as sociedades humanas funcionarem de modo ordeiro. A graça comum impede a sociedade, estragada e distorcida pelo pecado e pelo mal, de desintegrar-se totalmente.

O ensino da graça comum tem muitas implicações em como os cristãos vivem e servem no mundo. A graça comum de Deus é um modelo de graça com a qual os cristãos devam se envolver não apenas dentro da igreja e para com os crentes, mas no mundo e para com todos as pessoas. A graça comum encoraja aos crentes a desenvolverem pontos positivos de contato com descrentes para que vivam no mundo juntos e busquem fins comuns. Os cristãos devem dar atenção não apenas ao que os dividem, mas ao que os une com todos as pessoas. A graça comum é razão de os cristãos poderem apreciar os filmes, livros ou obras de arte produzidos pelos descrentes, vendo os como bons dons de Deus, ver nisso alusões à transcendência ou à graça

A graça comum lembra aos cristãos que o conflito desta era (que Abraham Kuyper chamou de “antítese”) é Deus e Satã, não entre cristãos e não-cristãos. A batalha não é entre dois grupos de pessoas mas entre dois poderes espirituais, que, significativamente, residem e entretece completamente cada pessoa.

O ensinamento da graça comum chama a igreja para ter múltiplos propósitos de ministério que correspondem aos múltiplos propósitos divinos. A despensa de alimentos do diaconato, o ministério de capelania hospitalar, e aconselhamento conjugal pastoral são todas partes da missão de Deus de salvar o mundo, mesmo que os recipientes destes ministérios possam não ser crentes ou jamais se tornarem crentes. O desejo profundo do cristão é que cada pessoa no mundo se curve a Jesus Cristo, ainda que dentro dessa missão abrangente de Deus, os ministros eclesiásticos em múltiplas situações sejam com múltiplas finalidades. Não se subordina o valor de um ministério a outro. Deus é glorificado em muitas coisas diferentes, e todos estes ministérios têm sua integridade e finalidade na missão abrangente de Deus salvar o mundo.

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